Ver o sol nascer. A chuva cair. O céu estrelar. A lua surgir (refletida no mar). Sentir o chão nos pés. O vento no rosto. O gosto salgado, doce, azedo. Cedo ou tarde, não importa. Andar em zigue-zague com Deus em linhas tortas. Andar aos assovios. Assoprar a sopa quente. Cantar intensamente qualquer canção. Por menor que seja. Por menor que surja no coração. Ter um cãozinho e uma árvore e um canteiro e um livro de se tocar ou tatear na memória. Contar histórias, estórias, estados de espírito. Espalhar espuma no banho, ter medo do escuro. Ter a cura em um sorriso. Arrancar o siso. Ser liso de vez em quando. Chorar por amor. Derramar o leite. Errar, pular, embriagar, eclodir. Ser por hora o palco. E também o público. Tomar um susto, roubar um beijo, sentir o corpo estremecer. Se entregar sem culpa, sem cismas e não compreender a dízima dos sentimentos. Viver com gula. Agir com sede. Ter holofotes e trajes de gala. Arrumar as malas, visitar um velho amigo. Estar liberto, luzindo a libido de cada dia. Começar hoje a poesia de amanhã. Sonhar ontem o traço de hoje. E que haja tudo em seu tempo: a luz e o sofrimento. Porque tudo há de emergir na carne: cada espinho com sua cerda. Cada flor com seu momento.
Mário Liz
Mário Liz