nem tudo que escrevo é dia. nem tudo que ouso é risco. nem tudo que choro é cisco. nem tudo que ergo é queda. nem tudo que é um é cada. nem tudo que subo, escada. nem tudo que penso, existo. nem todo suor, exausto. nem todo meu goethe, fausto. nem toda maré tá pra peixe. nem tudo que é luz é feixe. nem tudo que é faixa é gaza. nem toda porção é rasa. nem tudo que é flor é rosa. nem tudo que ri me zomba. nem tudo que explode, bomba. nem tudo que esbarra, tromba. nem tudo que vejo, brilha. nem todo fernando é ilha. nem toda pessoa, fernando. nem tudo que colho é lírio. nem todo meu arco é íris. nem todo meu barco pesca. nem tudo que é gozo é festa. nem tudo que como, farto. nem tudo que amo é quarto. nem tudo que chuto é bola. nem tudo que leio é bula. nem tudo que trago, fuma. nem todo deserto é duna. nem toda tristeza é só. nem todo meu laço, nó. nem todo meu grito ecoa. nem tudo se vende à toa. nem toda beleza é tua. nem toda nudez é crua. nem tudo que gela é frio. nem todo esse sangue, cio. nem tudo que corta é faca. nem mesmo o que crava estaca. nem tudo que estica é flácido. nem todo meu ódio, ácido. nem todas as margens, plácidas. nem todos os três, tenores. nem todos atores, ateus. nem tudo que cura é deus. nem tudo que diz é fala. nem toda bagagem, mala. nem tudo do prato, como. nem tudo que é homo é hétero. nem tudo que é hétero, gênio. nem tudo que é homo, sapiens. nem tudo que é sapo pula. nem tudo que sinto, adula. nem tudo que é bob, dylan. nem tudo respeita a fila. nem tudo que é fogo, péla. nem tudo que soca, pila. nem todo remédio, ampola. nem tudo que mato, morre. nem tudo que corre, foge. nem toda essa porta, entre. nem tudo que é hoje é sempre.
(mário liz)